Após a série de escândalos de pedofilia que acabaram atingindo o próprio o Papa, o Vaticano teme a perseguição de Bento XVI, mas várias vozes se levantam para exigir o fim da conspiração e "uma operação verdade" sobre o funcionamento da Igreja.
"Uma tentativa desprezível de atingir a todo custo" o Papa, queixou-se o órgão oficial do Vaticano, o Osservatore romano, depois das notícias veiculadas pelo New York Times sobre a decisão de Joseph Ratzinger, futuro Bento XVI, de evitar qualquer punição contra um padre americano acusado de ter cometido abusos sexuais em diversas ocasiões contra 200 crianças surdas entre 1950 e 1974.
Essas revelações, que vieram à tona após a descoberta de diversos escândalos de pedofilia na Europa, suscitaram comoção e raiva no mundo inteiro. Alguns caricaturistas apresentaram o Papa com os olhos tapados por sua mitra.
Nesta sexta-feira de manhã, o Avvenire, jornal dos bispos italianos, denunciou com virulência "a lapidação", "a frenética vontade de sujar e atingir" o Papa e toda a Igreja. As igrejas da França e da Inglaterra também deram o seu apoio ao Papa.
O ministro italiano das Relações Exteriores Franco Frattini também saiu em defesa de Bento XVI, se dizendo indignando com "os ataques escandalosos, vergonhosos e perigosos".
O vaticanista do Espresso (diário de esquerda) Sandro Magister também considerou "injusto" que "o Papa, que mais combate a pedofilia, seja o mais atacado".
De fato, Bento XVI sempre condenou os abusos. E no sábado passado, em uma carta aos irlandeses, traumatizados com os abusos praticados durante décadas por padres contra centenas de crianças, pediu que os culpados sejam levados à justiça.
Mas hoje, para as vítimas e para muitos especialistas, isso já não é suficiente. Muitos esperam uma avalanche de revelações, agora que a caixa de Pandora foi aberta.
Nesta sexta-feira, o New York Times afirmou ainda que Joseph Ratzinger sabia que um padre pedófilo, abrigado em sua diocese de Munique para tratamento, tinha sido transferido de outra paróquia para que não tornasse a abusar de crianças. As informações foram desmentidas pelo porta-voz da Santa Sé, Federico Lombardi.
Segundo o Vaticano, 3.000 acusações chegaram à Santa Sé de 2001 a 2010 por crimes cometidos por padres ou religiosos nos últimos cinquenta anos.
O Vaticano deve agora "abrir seus arquivos", considera Marco Politi, vaticanista do Il Fatto Quotidiano, segundo o qual o Papa se encontra agora em uma "encruzilhada". "Ou ele segue o caminho da transparência, ou ele ignora o passado e segue o conselho daqueles que entoam o coro da perseguição".
Outros vão mais longe. No La Stampa, Gian Enrico Rusconi considera que a Igreja não poderá deixar de refletir sobre o Direito Canônico e sua "inadequação absoluta" frente ao problema da pedofilia, cuja "excepcional gravidade moral não é mencionada".
Para ele, um "aprofundamento radical da questão da sexualidade seria a resposta apropriada".
Para Giancarlo Zizola, do La Repubblica, é "o funcionamento estrutural da Igreja" que levou à instauração de um sistema onde "a autodefesa da instituição, a cultura do segredo e a negação acabaram por prevalecer sobre os valores da justiça, da transparência e dos Direitos Humanos dos inocentes".
E segundo ele, "a operação verdade" não deve parar por aí. Porque quando Joseph Ratzinger abordava os casos de abusos sexuais na posição de Prefeito da Congregação pela Doutrina da Fé, de 1981 a 2005, ele se remetia a seu superior: o papa João Paulo II, cujo processo de beatificação está em andamento.
mle/dm
Nenhum comentário:
Postar um comentário